Por
minha formação católica, muitas vezes pensei em contestar – na
comunidade protestante – palavras que entendo como doutrina da
indiferença em relação à grande obra proposta aos cristãos:
doutrina da omissão em relação aos males do mundo, que precisam
ser combatidos.
Calei-me,
no entanto, diante da realidade do meu próprio ego (ou vaidade): da absoluta
certeza de que o ego é um grave abismo entre nós e Deus. Pois é
muito fácil cair na tentação de enaltecer nossas obras, depositar
nossa confiança em nós mesmos e acabar acreditando que somos bons e
merecemos o paraíso.
Quanto
mais vivi, vi e senti, mais me rendi ao fato de que nenhum de nós
merece o paraíso. Nenhum de nós é tão bom assim, de modo que os
pregadores evangélicos protestantes tem toda razão, ao dizer que
nenhuma pessoa merece o céu por aquilo que consegue ser ou fazer, ainda que faça muito.
Mas,
enquanto eu concordava e calava, o mal dominava o mundo.
Agora
vemos que os mais pobres trabalhadores pagam pela ganância alheia o
extremamente injusto imposto da inflação.
Então
tenho que admitir que, mais uma vez, nosso próprio ego conseguiu
atrair nossa atenção, fazendo do tema salvação própria o centro
de nossas vidas.
Mas
o centro da atenção do cristão precisa ser a honra a Deus todo
poderoso (primeiro mandamento de Jesus Cristo): um país que se diz
cristão e deixa-se dominar por corrupção desonra o Deus
verdadeiro. E o amor ao próximo precisa estar junto de nosso amor
próprio, conforme o mesmo mandamento.
Com essas contatações, sou levada a lembrar-me de uma pregação na qual o pregador disse que ele mesmo se
esquecia de orar pela manhã.
Na
ocasião eu pensei: como? Não é possível. Mas não ousei
admoestá-lo. Não tive suficiente coragem e lucidez para entender
que um pregador também cai em tentação e precisa ser reorientado.
Preferi acreditar que não o entendera bem.
Aquele
pregador suicidou-se.
Certa
de que Deus tem um projeto para tudo e todos, passei a refletir sobre
o propósito desses acontecimentos. E me veio a ideia de que Lutero
deveria ter estabelecido um sexto “somente” na reforma: o somente
pelo espírito.
Depois
refleti um pouco mais e entendi que talvez esse sexto “somente”
pudesse prejudicar a tese intelectual da reforma. Pois o espírito
jamais nos abandona. Apenas nós corremos o risco de abandoná-lo,
negligenciando a única obra que nos é imprescindível: a súplica a
Deus.
Jamais
se pode negar que entre tantas teses intelectuais sofisticadas e a
realidade de nossas vidas e do mundo: as vaidades e enganos, os
riscos..., somente o espírito de Deus pode conduzir-nos. Precisamos
buscá-Lo: pedir que Ele nos conceda luz, sabedoria, coragem para
realizar aquilo que deseja de nós, todos os dias e sempre,
eternamente...