terça-feira, 5 de julho de 2016

Um sexto “somente” e a única obra imprescindível

Por minha formação católica, muitas vezes pensei em contestar – na comunidade protestante – palavras que entendo como doutrina da indiferença em relação à grande obra proposta aos cristãos: doutrina da omissão em relação aos males do mundo, que precisam ser combatidos.

Calei-me, no entanto, diante da realidade do meu próprio ego (ou vaidade): da absoluta certeza de que o ego é um grave abismo entre nós e Deus. Pois é muito fácil cair na tentação de enaltecer nossas obras, depositar nossa confiança em nós mesmos e acabar acreditando que somos bons e merecemos o paraíso.

Quanto mais vivi, vi e senti, mais me rendi ao fato de que nenhum de nós merece o paraíso. Nenhum de nós é tão bom assim, de modo que os pregadores evangélicos protestantes tem toda razão, ao dizer que nenhuma pessoa merece o céu por aquilo que consegue ser ou fazer, ainda que faça muito.

Mas, enquanto eu concordava e calava, o mal dominava o mundo.

Agora vemos que os mais pobres trabalhadores pagam pela ganância alheia o extremamente injusto imposto da inflação.

Então tenho que admitir que, mais uma vez, nosso próprio ego conseguiu atrair nossa atenção, fazendo do tema salvação própria o centro de nossas vidas.

Mas o centro da atenção do cristão precisa ser a honra a Deus todo poderoso (primeiro mandamento de Jesus Cristo): um país que se diz cristão e deixa-se dominar por corrupção desonra o Deus verdadeiro. E o amor ao próximo precisa estar junto de nosso amor próprio, conforme o mesmo mandamento.

Com essas contatações, sou levada a lembrar-me de uma pregação na qual o pregador disse que ele mesmo se esquecia de orar pela manhã.

Na ocasião eu pensei: como? Não é possível. Mas não ousei admoestá-lo. Não tive suficiente coragem e lucidez para entender que um pregador também cai em tentação e precisa ser reorientado. Preferi acreditar que não o entendera bem.

Aquele pregador suicidou-se.

Certa de que Deus tem um projeto para tudo e todos, passei a refletir sobre o propósito desses acontecimentos. E me veio a ideia de que Lutero deveria ter estabelecido um sexto “somente” na reforma: o somente pelo espírito.

Depois refleti um pouco mais e entendi que talvez esse sexto “somente” pudesse prejudicar a tese intelectual da reforma. Pois o espírito jamais nos abandona. Apenas nós corremos o risco de abandoná-lo, negligenciando a única obra que nos é imprescindível: a súplica a Deus.

Jamais se pode negar que entre tantas teses intelectuais sofisticadas e a realidade de nossas vidas e do mundo: as vaidades e enganos, os riscos..., somente o espírito de Deus pode conduzir-nos. Precisamos buscá-Lo: pedir que Ele nos conceda luz, sabedoria, coragem para realizar aquilo que deseja de nós, todos os dias e sempre, eternamente...