sexta-feira, 10 de março de 2017

Sim, a Lava Jato pode! Temos que pressionar para que ousem vencer.

Podem denunciar 451 deputados federais por oferta de suborno à OAB e propor, como “ajuste de conduta”, a aprovação das “Dez Medidas” e de outra para acabar também com a corrupção em processos legislativos: o Congresso do Povo pela Internet.

Ao zombar do povo brasileiro, aprovando medidas que favorecem corruptos, em vez das medidas contra a corrupção, a Câmara dos Deputados praticou corrupção passiva, formalizada no texto daquele mesmo projeto (PLC 4.850-C de 2016), pela inclusão de matéria diferente, que agrada a advogados, o que corresponde à oferta de suborno.

Se tivessem feito um outro projeto para os advogados e aprovado no mesmo período, já seria suspeito. Mas ousaram incluir a matéria estranha no mesmo projeto, deixando claro que os advogados só terão aquilo que desejam se apoiarem o projeto que favorece corruptos.

E duas disposições daquele projeto podem agravar muito a corrupção no Brasil. Mas estão redigidas de forma tão obscura que a imprensa nem as comenta. Os advogados, no entanto, pelo seu conhecimento e prática, devem ter facilidade em detectá-las.

Na primeira, responsabilizam denunciantes pelas implicações da denúncia, assim como hoje ousam acusar a Lava Jato pela crise econômica no país. Pois o texto criminaliza denúncias, sem se restringir àquelas em que fique demonstrada má-fé por parte do denunciante, como segue:

Art. 17. A Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, passa a vigorar com as seguintes alterações:
(…)
Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade ou a propositura de ação contra agente público ou terceiro beneficiário, quando o autor o sabe inocente ou pratica o ato de maneira temerária.
Pena – reclusão de seis meses a dois anos e multa.
Parágrafo único. Além da sanção penal, o denunciante ou membro do Ministério Público está sujeito a indenizar o denunciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.”(NR)

O texto original da lei 8.429 diz:

Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade contra agente público ou terceiro beneficiário, quando o autor da denúncia o sabe inocente.
Pena: detenção de seis a dez meses e multa.

Assim o texto da lei vigente só prevê punição para autores de denúncia, se ficar demonstrado que ele sabia de eventual inocência do denunciado ou que agiu de má-fé. E a pena máxima, que pretendem aumentar para dois anos, é de 10 meses de prisão.

Vê-se que pretendem inibir iniciativas do Ministério Público, introduzindo o crime por “propositura de ação”. Mas pretendem também inibir qualquer denúncia, com o texto: “ou pratica o ato de maneira temerária”, sem incluir nada que restrinja ou especifique o que pretendem classificar como “maneira temerária”. Isso permite uma ampla possibilidade de interpretações.

Pois o principal significado de temerária é: “Que apresenta risco; arriscado, perigoso...”. E sabemos que toda denúncia apresenta risco. Mas todos sabemos também que somente aquele que pratica corrupção tem poder para evitar esses riscos, evitando praticá-la. Assim somente o corrupto poderia ser responsabilizado pelos riscos envolvidos na divulgação de seus atos.

Mas, pelo texto aprovado na Câmara dos Deputados, fica evidente que pretendem inverter a culpa, transferindo para o autor da denúncia a responsabilidade por esses riscos. Por mais absurdo que possa parecer, pretendem estabelecer que o denunciante é o criminoso. De modo que, antes de denunciar, passaria a ser preciso considerar eventuais consequências da denúncia. Isso gera praticamente uma obrigação de calar, de acobertar a corrupção. E pode ainda servir de pretexto para a cumplicidade por omissão.

Eu consigo interpretar a intenção desse texto, porque – por mais absurdo que possa parecer – fui demitida do Banco do Brasil por denunciar evidências de fraude a autoridades competentes. Desde 2014, publico artigos sobre esses fatos neste blogue. Em abril de 2016, publiquei matéria com as provas de procedência das denúncias que apresentei.

Outra disposição do mesmo artigo (17) do projeto de lei 4.850-C/2016 estipula prazo de prescrição para ações de ressarcimento ou para as ações que pedem a devolução do dinheiro roubado dos cofres públicos, além de prescrição para perda da função pública e suspensão dos direitos políticos. Querem que essas ações sejam encerradas sem sentença de última instância, assim como ocorre hoje com as ações penais. Pelo sistema tradicional, sabemos que o resultado disso é que políticos condenados raramente cumprem pena.

Tanto é assim que o estabelecimento de prescrição para ações de ressarcimento é proibido por uma ressalva contida no parágrafo 5º do artigo 37 da Constituição Federal. Mas, contrariando a Constituição Federal e o bom senso, ousaram estabelecer que a ação prescreve e que – apresentando os recursos que demoram a ser julgados – os corruptos não terão mais que devolver aquilo que roubaram nem perder função e direitos políticos, mesmo com investigação, prova e até com condenação nas instâncias inferiores, que são três no Brasil. Mas veja como disfarçaram esse texto:

Art. 23. A ação destinada a levar a efeito as sanções previstas nesta Lei prescreve no prazo de dez anos, contado da data do fato.
I – (revogado);
II – (revogado);
III – (revogado).
Parágrafo único. Se o ato de improbidade administrativa configurar crime, o prazo prescricional será regulado de acordo com o art. 109 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, independentemente da propositura da respectiva ação penal.”(NR)

Veja o texto original do artigo 23 da lei nº 8.429/1992:

Art. 23. As ações destinadas a levar a efeito as sanções previstas nesta lei podem ser propostas:
I até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança;
II dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.
III até cinco anos da data da apresentação à administração pública da prestação de contas final pelas entidades referidas no parágrafo único do art. 1o desta Lei.

Assim o artigo 23 da lei nº 8.429/1992 determina prazos para apresentar a ação judicial. Mas se fizessem um artigo específico, chamariam atenção sobre o tema e todos perceberiam que se trata de uma disposição nova. Assim preferiram retirar do texto da lei o prazo para propor ação, introduzindo, dessa forma obscura, o prazo de prescrição das ações em andamento.

Com tudo isso – além da mordaça contra juízes e promotores, que a imprensa está divulgando desde dezembro e que fere sobretudo nosso direito de acesso à informação – fica claro que o texto que favorece advogados é uma oferta de suborno para garantir que silenciem sobre tudo isso e ainda contribuam para que esse absurdo projeto de lei seja sancionado.

Assim o Ministério Público pode denunciar por corrupção passiva 450 deputados federais que votaram a favor daquele projeto e também o deputado Rodrigo Maia, que não votou, porque presidiu a sessão do dia 29 e madrugada de 30 de novembro de 2016, mas defende publicamente aquele projeto e toda a sua tramitação ilegal.

Pois assim diz o Código Penal sobre Corrupção passiva, artigo 317:

Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

E, no artigo 18 daquele mesmo projeto – logo depois dessas disposições absurdas e obscuras que estão contidas no artigo 17 –, definiram como crime até a atividade de leigos que prestem ajuda gratuita que possa ser entendida como atividade de advogado, além de oferecer muitas outras vantagens aos advogados inscritos na OAB. Veja o texto neste link.

O Ministério Público também tem poder para propor acordos, chamados Termo de Ajustamento de Conduta, conforme descrição neste link. Com isso, podem conseguir a aprovação das medidas de combate à corrupção já propostas. A podem avançar ainda muito mais, propondo sobretudo uma medida para acabar com a corrução no Congresso Nacional: o congresso do povo pela internet.


O Congresso do Povo

Num congresso que permita participação de todos os voluntários interessados ficaria impossível subornar um número suficiente de pessoas para influenciar no resultado de uma votação. Além de acabar com essa forma de corrupção e com o discurso que pretende justificar a formação de quadrilha na governabilidade, o Congresso do Povo garantiria a prevalência do interesse público, contra o interesse de indivíduos e corporações.

Para garantir que os voluntários estudem as matérias, bastaria apresentar um questionário, exigindo certo número de acertos para validar um voto.

As perguntas poderiam ser bem simples, com questões retiradas do texto do próprio projeto votado ou de documentos e vídeos colocados a disposição de todos, na plataforma do Congresso no Internet.

Para evitar a profissionalização do assessoramento em votos, poderiam ser determinados momentos para votação em sábados e domingos, de modo que as questões lançadas num momento não se repetiriam em momentos seguintes e as questões de cada momento seriam sorteadas pelo sistema de forma aleatória.

As votações deveriam acontecer em fins de semana, para permitir a participação das pessoas que trabalham de forma regular.

Os projetos de lei e qualquer outra matéria seriam redigidos por funcionários concursados. Mas os projetos recusados poderiam ser revisados para incluir, alterar e excluir disposições, numa segunda plataforma, na qual também seriam promovidos projetos de iniciativa popular. Mas só poderiam atuar nessa segunda plataforma os voluntários que tivessem voto validado com regularidade na primeira plataforma. Essa regularidade poderia ser determinada por um percentual dos projetos votados.

O sistema também poderia dar pontos positivos e negativos para cada ação dos voluntários e uma ajuda de custo para aqueles que alcançarem melhor pontuação a cada mês. 

Se cinco mil voluntários receberem 3 mil reais, custariam 15 milhões por mês. Hoje o Congresso Nacional tem um orçamento anual de 10.2 bilhões, que representa um custo de 850 milhões por mês (http://www.contasabertas.com.br/website/arquivos/13678).


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