O
texto do projeto “de abuso de autoridade” (PLS 85/2017, antigo
PLS 280/2016) extingue disposições que nos protegem contra o abuso
de autoridade, contidas na lei 4898/1965 – além de inibir a
punição a criminosos e de favorecer autoridades envolvidas em
pedofilia, agressão e exploração de crianças e adolescentes
(http://soniardecastro.blogspot.com.br/2017/02/maisabusos-naquilo-que-chamam-de.html).
Se
esse projeto for aprovado, já não se poderá mais processar
criminalmente autoridades que abusarem de seu poder para violar nosso
direito de ir e vir, de crença e culto religioso, de incolumidade
física e outros. A violação de sigilo de correspondência é crime
definido no código penal. Mas deixaria de ser crime de abuso de
autoridade.
O
mais grave para o interesse público é a extinção da definição
de crime de violação das “garantias legais asseguradas ao
exercício profissional”. Pois essa definição de crime está
mantida apenas para a atividade de advogados.
Isso
pode dificultar muito o exercício do jornalismo e de outras
profissões vulneráveis e importantes para a preservação de outros
direitos e garantias fundamentais.
O
senador Roberto Requião apresentou novo substitutivo, afirmando que
abandonou o projeto anterior e adotou novo texto apresentado pelo
senador Randolfe Rodrigues, que teria sido
sugerido pelo procurador-geral Rodrigo Janot.
Mas,
além da numeração, ele adotou pouco daquele substitutivo. Pois
manteve disposições absurdas, como a manutenção no cargo de
autoridades condenadas uma primeira vez por abuso de autoridade e por
qualquer crimes contra crianças e adolescentes.
Como
já é
praticamente impossível que cumpram pena, numa primeira condenação,
essa garantia proporcionaria total impunidade.
E
foi mantido o crime por ordem de condução coercitiva e por gravação
em ambiente.
Mas
esse novo texto abandona, sim, as disposições que seguem, contidas
em texto publicado em março, que ofereciam proteção a cidadãos
comuns:
Art.
23.
Praticar ou mandar que se pratique violência física ou moral contra
pessoa, no exercício da função ou a pretexto de exercê-la.
Art.
36. Deixar, sem justa causa, de
determinar a instauração de procedimento investigatório para
apurar a prática de infração penal ou de improbidade
administrativa, quando deles tiver conhecimento e competência para
fazê-lo.
Por
outro lado, esse projeto multiplica por cinco as disposições que
protegem presos e investigados, que estão contidas em 23 artigos e
20 incisos. Somando tudo, há 43 definições de crimes contra
investigados e presos, que são apenas oito na lei 4898/1965.
Essas
definições que protegem presos e investigados são ainda muito
específicas, de forma que também deixam de garantir proteção
ampla, como a dessa outra definição da lei 4898, que também
ficaria revogada: “o ato lesivo da honra ou do
patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com
abuso ou desvio de poder ou sem competência legal” (artigo 4º-h).
E
o substitutivo apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues (que afirmam ter sido sugerido pelo
procurador-geral Rodrigo Janot) também revoga a lei 4898 e com ela
todas essas formas de proteção a cidadãos comuns, além de
confirmar outras disposições absurdas, que visam a inibir a ação
de juízes e procuradores, como: “Privar
alguém de liberdade ordenando ou executando a medida fora das
hipóteses legais com a intenção deliberada de constrangê-lo
indevidamente no curso de investigação ou processo judicial”;
trouxe
de volta o texto que praticamente criminaliza a proposta de delação
premiada: “Constranger
alguém, mediante violência ou grave ameaça, a depor sobre fatos
que possam incriminá-lo” e também
prevê que “divergência na
interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas” só não
seria crime se fosse fundamentada. Ou seja, o procurador-geral
Rodrigo Janot concordaria em determinar que juízes poderiam condenar
outros juízes, caso decidissem que não houve fundamentação para
uma divergência.
É
difícil acreditar que o chefe do Ministério Público Federal
recomendou a aprovação dessas disposições que pretendem condenar
juízes como criminosos, por exercerem sua função, determinando
prisão e outros procedimentos. Mas consta na “justificação”
do projeto: “são essas as contribuições encaminhadas pela
Procuradoria-Geral da República ao parlamento”.
O
procurador-geral Rodrigo Janot poderia
ter negado a autoria daquele substitutivo, mas não o fez, pelo
contrário. Foi pessoalmente ao Senado e deu declarações para a
imprensa que levam a crer que recomenda mesmo aquele texto.
A
votação desse projeto na Comissão de Constituição e Justiça do
Senado está agendada para a próxima quarta-feira, dia 26.
PS (10/09/2017): Como foi aprovado no Senado, esse projeto tramita agora na Câmara dos Deputados sob número 7596/2017.
PS (10/09/2017): Como foi aprovado no Senado, esse projeto tramita agora na Câmara dos Deputados sob número 7596/2017.